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23/01/2020
Bolsonaro exonera secretário da Cultura, que fez discurso com frases semelhantes às de ministro de Hitler
Em vídeo para divulgar concurso, Roberto Alvim disse que a arte deve ser 'heroica' e 'imperativa', 'ou não será nada', assim como Goebbels. Secretário disse que caso foi 'coincidência retórica'.
O presidente Jair Bolsonaro exonerou nesta sexta-feira (17) o secretário nacional da Cultura, Roberto Rego Pinheiro, conhecido como Roberto Alvim, que fez um discurso no qual usou frases semelhantes às usadas por Joseph Goebbels, ministro da Propaganda de Adolf Hitler durante o governo nazista. Goebbels era antissemita radical e foi um dos idealizadores do nazismo.
 
Assim como Goebbels havia afirmado em meados do século XX que a "arte alemã da próxima década será heroica” e “imperativa”, Alvim afirmou que a “arte brasileira da próxima década será heroica” e “imperativa”. (Compare os discursos abaixo).
 
A exoneração foi publicada em uma edição extra do Diário Oficial da União, no início da tarde. O secretário-adjunto do órgão, José Paulo Soares Martins, deve assumir o comando interino até a escolha de um substituto.
 
Em nota, Bolsonaro afirmou que a permanência de Alvim no governo ficou "insustentável".
 
 
"Comunico o desligamento de Roberto Alvim da Secretaria de Cultura do Governo. Um pronunciamento infeliz, ainda que tenha se desculpado, tornou insustentável a sua permanência", afirmou Bolsonaro.
 
O presidente disse ainda que repudia ideologias "totalitárias e genocidas".
 
"Reitero nosso repúdio às ideologias totalitárias e genocidas, bem como qualquer tipo de ilação às mesmas.Manifestamos também nosso total e irrestrito apoio à comunidade judaica, da qual somos amigos e compartilhamos valores em comum", completou o presidente.
 
 
Nesta quinta-feira, antes da publicação do vídeo de Alvim, Bolsonaro participou de uma live no Facebook ao lado do agora ex-secretário. Na ocasião, Bolsonaro disse: “Ao meu lado aqui o Roberto Alvim, o nosso secretário de Cultura. Depois de décadas, agora temos sim um secretário de cultura de verdade, que atende o interesse da maioria da população brasileira, uma população conservadora e cristã."
 
 
Fala do secretário
O discurso do secretário, divulgado em uma rede social na quinta (16), se referia ao lançamento de um concurso de projetos de arte.
 
O vídeo de Alvim ganhou grande repercussão nas redes sociais e tanto o nome do secretário quanto o de Goebbels foram parar entre os assuntos mais comentados do Twitter no Brasil.
 
A fala dele também gerou forte repercussão nos meios artístico e político. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pediram a demissão imediata do secretário.
 
Nesta manhã, Alvim afirmou em post no Facebook que a semelhança entre as frases foi "apenas uma frase do meu discurso na qual havia uma coincidência retórica".
 
Além da fala semelhante à de Goebbels, o vídeo de Alvim apresenta, ao fundo, uma música do compositor alemão Richard Wagner (1813-1883), extraída da ópera Lohengrin. O artista escreveu ensaios nacionalistas e antissemitas, e foi tomado pelos nazistas como exemplo de superioridade musical e intelecto.
 
 
Compare os discursos:

 
Roberto Alvim:
 
“A arte brasileira da próxima década será heroica e será nacional, será dotada de grande capacidade de envolvimento emocional, e será igualmente imperativa, posto que profundamente vinculada às aspirações urgentes do nosso povo – ou então não será nada”

 
Joseph Goebbels:
 
“A arte alemã da próxima década será heroica, será ferreamente romântica, será objetiva e livre de sentimentalismo, será nacional com grande páthos e igualmente imperativa e vinculante, ou então não será nada"
No discurso de Goebbels, feito para diretores de teatro, ele buscava dar uma orientação estética aos artistas. Ele reconhecia que o expressionismo, escola artística que ganhou força na Alemanha no fim do século XIX, tinha tido algumas ideias básicas “positivas”, mas se degradara no experimentalismo.

 
Justificativa do secretário
Em seu esclarecimento no Facebook sobre as declarações semelhantes às de Goebbels, Alvim afirmou que "o trecho fala de uma arte heroica e profundamente vinculada às aspirações do povo brasileiro". "Não há nada de errado com a frase", argumentou.
 
"Todo o discurso foi baseado num ideal nacionalista para a Arte brasileira, e houve uma coincidência com UMA frase de um discurso de Goebbles... Não o citei e JAMAIS o faria. Foi, como eu disse, uma coincidência retórica. Mas a frase em si é perfeita: heroísmo e aspirações do povo. É o que queremos ver na Arte nacional", disse Alvim.
Depois, em uma entrevista à rádio gaúcha, Alvim disse que encontrou a frase na internet e que o fato de concordar com a ideia não significa que apóie extermínios em massa, como os que realizou o nazismo. "Goebbels preconizava uma ideia de uma arte nacional, uma arte nacionalista? Sim. Eu também preconizo essa ideia? Eu também preconizo essa ideia. Outros intelectuais absolutamente incríveis também preconizam essa ideia? Também preconizam essa ideia. Daí a estender a associação para extermínio de pessoas em campos de concentração é uma coisa muito forçada", continuou o secretário.

"Qualquer pessoa com o mínimo de sanidade mental não pode ser cúmplice ou simpática a um regime que exterminou pessoas, um regime absolutamente genocida. Um regime tão genocida quanto todos os regimes de esquerda ao longo do século 20, como o regime de [Josef] Stálin, Mao Tsé Tung, Fidel Castro, entre outros. Evidentemente que a minha repugnância é visceral a qualquer associação com esse ideário nazista", completou Alvim.

Sobre o uso da ópera Lohengrin, o secretário disse que foi uma escolha pessoal dele. "Lohengrin é a última ópera escrita pelo Wagner. É uma ópera que resulta da conversão dele ao cristianismo. É uma ópera absolutamente transcendental, que nos revela a face de Deus desde o seu primeiro acorde", explicou.
 
 
Repercussão
O discurso de Alvim teve repercussão imediata entre políticos, artistas e entidades da sociedade civil.

 
Veja algumas reações abaixo:
 

Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente do Senado 
"No interior do Amapá, na localidade de Ariri, participando da retomada do programa 'Luz para Todos', somente agora tive o desprazer de tomar conhecimento do acintoso, descabido e infeliz pronunciamento de assombrosa inspiração nazista do secretário de Cultura Roberto Alvim, do governo federal."
""Como primeiro presidente judeu do Congresso Nacional, manifesto veementemente meu total repúdio a essa atitude e peço seu afastamento imediato do cargo."
 
 
Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara
"O secretário da Cultura passou de todos os limites. É inaceitável. O governo brasileiro deveria afastá-lo urgente do cargo."

 
Confederação Israelita do Brasil
"Emular a visão do ministro da Propaganda nazista de Hitler, Joseph Goebbels, é um sinal assustador da sua visão [de Alvim] de cultura, que deve ser combatida e contida. (...) Uma pessoa com esse pensamento não pode comandar a cultura do nosso país e deve ser afastada do cargo imediatamente."
 
 
Embaixada da Alemanha no Brasil
"O período do nacional-socialismo é o capítulo mais sombrio da história alemã, trouxe sofrimento infinito à humanidade. A Alemanha mantém a sua responsabilidade. Opomo-nos a qualquer tentativa de banalizar ou mesmo glorificar a era do nacional-socialismo."

 
Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF)
“Há de se repudiar com toda veemência a inaceitável agressão que representa a postagem feita pelo secretário de Cultura. É uma ofensa ao povo brasileiro e, em especial, à comunidade judaica.”
 
 
Zélia Duncan, cantora
“Definitivamente o fracasso subiu à cabeça do patético encarregado da falta de Cultura, Roberto Alvim...ator canastrão, diretor fracassado, encontrou nesse governo desafinado e brega, seu frágil êxtase nazista-fetichista. Faltou o bigode, pro fã do crime aparentar melhor com o ídolo”.

"A trilha utilizada pelo nazi brasuca é Wagner. Artista utilizado por Hitler, para exaltar a raça ariana, os brancos 'puros'. Wagner era antissemita, não gostava de judeus. O circo de Alvim é lamentável e criminoso, se fôssemos um país direito, ele seria preso."


Fonte: Luiz Felipe Barbiéri, G1 | Fonte Imagem: Freepik e Pixabay | Arte: becartt


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